Com apenas cinco anos, Matheus resolveu passar uns dias na fazenda. Fato esse que deixou a mãe do menino muito preocupada. Era a primeira vez que viajava somente na companhia do pai, além do mais, lá não havia outras crianças para ele brincar. Ao sair a mãe cochichou no seu ouvido:
_ Se sentir falta da mamãe na hora de dormir, liga que eu irei buscar você.
Engolindo em seco, o homenzinho enterrou o chapéu na cabeça e subiu na caminhonete contando com o próprio esforço. E como lhe custou! Suas pernas curtinhas, a caminhonete alta, as botinas travando-lhe os movimentos. Todos o aguardavam com grande entusiasmo. A beleza e a leve brisa do campo pareciam conservar a criança íntima de cada um. Logo tornaram-se grandes amigos. Matheus passou a achar os amigos da fazenda infinitamente mais divertidos que os amigos do playground. Não existia competição, falava-se de tantos outros assuntos e não só sobre games, sobre aparelhos de última geração, tecnologia de ponta. Em pouco tempo tornou-se o mascote da turma. A mãe de Matheus, já preocupada com a falta de notícias, tentou falar com ele algumas vezes, mas acabou desistindo. Ele estava sempre ao lado dos peões da fazenda se divertindo a valer. Quando tentou à noite ele havia dormido com as galinhas, tamanho o seu cansaço. No dia combinado para a sua volta, engoliu o choro e sorriu para os companheiros que se comprometeram a escrever-lhe com frequência. Dois dias após a sua partida, chegou a primeira missiva. Ele correu até a cozinha:
_Dona Zica, leia para mim, por favor, é dos meus novos amigos. Encantada pela alegria, dona Zica parou o que fazia e pôs-se a ler com boa vontade:
"Querido Matheus sentimos muita saudade de você lembramos sempre de nossas brincadeiras o pônei também está até de orelha caída João Murici manda lembranças e o Risadinha está precisando mudar de nome pois depois da sua partida ele não riu mais a cozinheira quando prepara o seu prato preferido enche os olhos d'água..."
Dona Zica foi ficando vermelha, roxa e amarela e quase desmaiou.
_Socorro, Zélia, me ajude! Gritou Matheus apavorado. Zélia deu-lhe álcool para cheirar, esfregou-lhe os pulsos, foi quando ela finalmente deu sinal de vida. Dona Zica disse exaurida:
_Vou para o meu quarto descansar um pouco... Desesperado, Matheus insiste com a arrumadeira:
_Por favor, Zélia, leia pra mim, mas comece pelo início. Zélia foi lendo, lendo, até não poder mais. Também sentiu-se mal com o espanador na mão. Carla, mãe de Matheus entra em casa e se depara com a cena:
_O que houve, meu filho?
_Não sei, mamãe, pedi a elas que lessem a minha carta e todas duas passaram mal.
Zélia volta do desmaio, ainda meio pálida:
_Desculpe, dona Carla, vou me deitar só um segundinho e já volto. Estou sem ar e muito cansada.
_Mamãe, o que há de errado com a minha carta.
Lendo em silêncio, Carla descobriu em segundos:
_Eles não pontuaram a carta, meu filho. Não usaram vírgula, ponto, nada!
_Qual o problema?
_Se a carta fosse pontuada corretamente, daria tempo para o leitor respirar e fica mais fácil para compreensão da mensagem. Vou ler pontuando e você entenderá tudinho. A partir desse episódio, Carla decidiu ativar a escola da fazenda, contratar a melhor professora da região, para que adultos pudessem voltar a estudar e ninguém mais fosse acometido por uma síncope, após ler uma ler uma longa carta que viesse da fazenda.
Stella Tavares